Ataque dos cães, o filme

CREIO que nem todo mundo vai gostar do filme “Ataque dos cães”, da neozelandesa Jane Campion, produzido e lançado agora em dezembro pela Netflix. Mas o filme é bom. Remexe em questões que ainda são explosivas, como machismo, masculinidade tóxica e homossexualidade.

Ambientado em 1925 no estado de Montana (EUA), estrelado por Benedict Cumberbatch, Kirsten Dunst e Kodi Smit-McPhee, a história gira em torno de um fazendeiro rico e autoritário que direciona sua masculinidade tóxica contra a mulher de seu irmão e o filho dela.

Trata-se de um faroeste sem tiroteio e sem duelo, sem mocinho nem bandido. É um filme meditativo, carregado de silêncios, elipses, entrelinhas e deduções que se arrastam até o final, quando então se dá o desvendamento da trama, a revelação dos mistérios.

Evitando o que chamam de spoiler, digo que o filme convida a refletir sobre o fato de que a sexualidade humana, deturpada por preconceitos, crenças, poder e outros fatores culturais, muitas vezes pode ser um grande mal-entendido. Creio que essa seja a mensagem essencial do filme.

O título do longa-metragem é muito sugestivo. Os ataques de cães são uma passagem bíblica, uma metáfora indicando que todos temos no nosso íntimo alguns cães (irracionais) que podem atacar, e nos atacar, seja lá qual for a nossa orientação sexual.

Mas o filme mostra também que tudo poderia ser diferente: há os que não carregam esses cães dentro de si, como o personagem George, vivido por Jesse Plemons, que se casa com uma viúva frágil e depressiva, assume o enteado meio afeminado, não se importa com a homossexualidade do irmão e vive em paz, serenamente, bem-resolvido.

No mais, fotografia, cenários e paisagens são de tirar o fôlego. Não sei se exagero, mas me parecem dignas de Oscar. Ambientado em Montana (EUA), as montanhas do filme, na verdade, são da Nova Zelândia, o que não é nenhum problema.

Enfim, é um filme de época que poderia ser ambientado em qualquer época; é um faroeste que não é exatamente um western, pois cairia bem em qualquer outro gênero; o título fala de cães, mas não se trata de cachorros… Deve ser porque a temática do filme é universal, cabe em qualquer tempo, lugar e gênero.

Creio, pois, que vale a pena assistir a mais essa produção do streaming. Até porque sempre vale a pena refletir sobre questões humanas fundamentais como é o caso da sexualidade, que é fonte de vida e prazer, mas, estupidamente, como mostra o filme, pode se transformar em motivo de dor e morte.

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